Olha, realmente, eu vim despida de todo e qualquer tipo de preconceito - aliás, como tudo na vida é dual e somos naturalmente hipócritas, eu discrimino quem discrimina... Não deveria, mas cabe em meu pacotinho: "sou humana e imperfeita, sim, mas me coloco em movimento de melhora a cada dia, aqui e agora!".
Venho de uma família mestiça em TODOS os sentidos! TODOS! Inclusive de cor, credo, instrução, educação e situação financeira. Vivo e convivo com TODOS os tipo de pessoas. E, sinceramente, eu AMO MUITO TUDO ISSO! Tenho o privilégio de saber que tenho acesso aos mundos que gravitam em paralelo ao meu. Tenho consciência de que todos somos peculiares e respeito os espaços de cada um. Lógico que me pego cobrando e criticando um ou outro, mas, como já falei antes: tudo na vida é dual e somos naturalmente hipócritas, eu
discrimino quem discrimina... Não deveria, mas cabe em meu pacotinho:
"sou humana e imperfeita, sim, mas me coloco em movimento de melhora a
cada dia, aqui e agora!".
Bom, me deixa entrar logo no assunto que vim postar...
Estava numa cidade próxima, visitando alguns parentes paternos - que são minha FAMÍLIA - e, em meio a tanta coisa, sentamos eu e irmã para conversarmos com "tatia Joana" - tia avó nossa. "Tatia", como chamamos desde criança, porque era como papai a chamava quando criança, tem 91 anos. Um dia ainda escrevo sobre a vida dela - mulheres "comuns", com vidas "comuns" não têm nada de comum... Pois bem, conversa vai e conversa vem, como de costume, ela puxava o assunto comigo e com irmã, sobre "quando vão ter outro?" - "outro", leia-se "outro filho"... Pois eu tenho um e irmã tem uma. Daí, irmã disse:
- Tatia, não é barato ter e manter filho, não.
E "tatia" concorda, dizendo que "é verdade, minha filha!". Eu, seguindo a linha de raciocínio que escuto com frequência e pude comprovar em minha infância, digo:
- É, tatia, eu sei que na antigamente era mais fácil. As pessoas se ajudavam mais. Hoje em dia é tanta cobrança, tudo tem que ser pago que ter filho acaba envolvendo condições de manter...
Depois de muitos anos, escutando esse discurso, eu "jurava de pé junto" que ela também pensava assim. Mas, como disse, mulheres comuns, com vidas comuns não têm nada de comum. Ela tem uma vida cheia de emoções - entenda "emoções" como de tudo: boas e ruins. Rompendo esse ciclo vicioso de "as gerações anteriores eram mais felizes" ela revela:
- Eu queria ser é dessa geração agora! Essas meninas têm filho por aí é porque querem! Em minha época, não tinha nada. Ninguém tocava no assunto e a gente era "obrigada" a ter um filho por ano. Era cansativo demais! Marido exigia isso! Me lembro que fui ao médico, naquela época e já nem me lembro quantos filhos eu já tinha - pausa para contar...
- Quantos a senhora teve, tatia? - pergunta irmã
- Vivos nasceram 9 e 2 que nasceram mortos.
- Poxa! - exclamamos juntas, eu e irmã!
- É, minha filha, mas cê pensa que era fácil? Não era não. Quando pedi ao médico: "Dr., dá para o senhor me ver um remédio para eu parar de engravidar?", ele me expulsou da sala, gritando que eu era louca... Hoje, os médicos estão chamando e essas meninas parindo por aí e deixando para a vida cuidar, dizendo que é descuido. Descuido era em minha época, que ninguém sabia de nada. Hoje, com tanta informação, descuido é desculpa!
Veja, quando a gente vai a fundo, a gente descobre que nem tudo era tão bonitinho! Ela, no auge dos seus 91 anos revelou isso, como um desabafo de ANOS! E não foram 20 ou 30 anos... desabafo de 70, 80 anos! Ou dos 91!
A cobrança; o estabelecimento de "metas culturais" enquanto tradição; o sexismo, em forma de "poder machista e heteronormativo", onde o homem, enquanto ser do gênero masculino "pode tudo!"; o cotidiano com a responsabilidade de já ter que cuidar de filho e casa, ser "esposa" e, com isso, ter todo o tempo ocupado, para não se ter tempo de pensar e refletir, daí, questionar e lutar pela liberdade, emudeceu muitas mulheres, pela falta de "tempo", mesmo. Para se romper com isso - e continua essa luta por tanta ruptura - foi preciso muito "peito" e sutiã queimado. Ainda escuto muitas mulheres de gerações anteriores me dizerem: "era melhor como antes!". Hoje, entendo o que elas querem dizer, só que não sabem expressar bem... O que elas dizem não é querer ser uma mulher tapada pela opressão machista, mas hoje, nós somos, ainda, "cobradas" para atingir um padrão de excelência desumano e sobre humano, onde trabalhamos "fora" e dividimos as contas, mas a casa ainda é nossa responsabilidade. Graças a Deus, algo já começa a mudar com relação aos filhos, justiça seja feita, muitos homens se esforçam para romper com essa ditadura silenciosa e mascarada de séculos, e já assumem-se corresponsáveis pela educação ATIVA e com AMOR dos filhos!
Ou seja, quando algumas mulheres me dizem isso, vem um adendo: "Pô, meu marido já se aposentou e fica em casa, de pernas para o ar. Eu me aposentei e continuo dona de casa...". Claro que me refiro ao geral, porque as exceções existem, ainda como exceções...
Eu curto muito conversar com as pessoas. E, se todo mundo der atenção ao idoso ao seu lado, verá um mundo muito maior se abrir. Hoje, minha querida e amada "tatia", pode falar comigo, com irmã sobre isso. HOJE. Mas, por quantos anos e tudo o que ela já viveu - e falo de dor, muita dor e vida sofrida, mas ela sempre forte e com um humor contagiante - ela precisou calar, por sabedoria e por medo?
Hoje, ainda lutamos por igualdade! Só que as pessoas lutam pelo fim da desigualdade, acirrando a desigualdade. Essa contradição e falta - ausência, mesmo - de base, de valores, faz com que essa juventude de hoje tenha ausência de referencial e luta, grita e brada sem mensurar resultados. As gerações anteriores, tinham a base, os valores, mas não tinham a garra, a combustão necessária e em quantidade suficiente para reagir mais, porém, conseguiram, com poucos e com muita vontade dar um ponta pé inicial, um start... adormecido pela nossa atual falta de tempo por ter o tempo integral ocupado!
O importante é estar em movimento. Um dia, as coisas apaziguam e tomam UM rumo, não vários caminhos aleatórios! Hoje, temos abertura para diálogos, para trocas, para se diluir qualquer assunto, esgotar, para não remoer... mas, raramente fazemos... Os encontros de gerações podem ser saudáveis, se assim fizermos!
Hoje, podemos falar, aparentemente protegidos pela Lei, para tanto, precisamos nos salvaguardar para não atingir alguém que se doa por se sentir atingindo, sem ser... A fragilidade da atualidade está na APARÊNCIA DE SER, em vez de ser. Antigamente, as mulheres sofriam caladas, mas tinham uma força maior, uma força que passava para as filhas e filhos, aos poucos, como quem planta sementinhas. Era um movimento muito pequeno, mas para longo prazo. Para, hoje, esbarrar no estágio de mulheres objetos, que querem tudo tão fácil, se vendem como troféu barato e pouco fortalecem o intelecto, a razão e as boas emoções... Aí, enfraquece o movimento... Né, não?
Vamos para frente! Porque a luta é pela igualdade e respeito às DIFERENÇAS. Ou seja, devemos considerar que existem diferentes, mas todos têm o direito de serem quem são - desde que não matem, roubem ou destruam, passando por cima para atingir o que quer... toda liberdade tem limites!
O princípio da liberdade está em aceitar o limite de acesso.
Que fique claro para cada um de nós: cada geração traz a sua beleza, traz o seu ensinamento... traz lições que nem os contemporâneos se dão conta... de que a dualidade existe por algum motivo. Tudo vem com a "dor e a delícia de ser o que é", como diz Caetano Veloso. O "é" é o que deve ser visto!
Vivendo e aprendendo com os mais velhos e os mais velhos com os mais novos!
Pat Lins - costurando a minha colcha de retalhos, sem retaliação!