quarta-feira, 16 de outubro de 2013

UM DIA DE FÚRIA - OU DO MEDO? - VÍTIMAS E/OU ALGOZES - os dois lados das duas culpas e das duas inocências de um mesmo caso fatal para todos os envolvidos.

Imagem do filme "Um dia de fúria" - assisti há muitos anos atrás e foi a primeira que me veio à mente...

O título é longo propositadamente, para nos abrir à reflexão, neste momento e não nos colocarmos no papel de julgadores perfeitos

Uma boa reflexão é sempre válida... e não tenho a menor pretensão de ser entendida, afinal, eu, como pessoa e consciente da nossa fragilidade humana, mental e emocional, bombardeada diariamente pela neurose imposta do medo e terror dos nossos telejornais - que, acredito eu, acabam dando muito mais força ao terrorismo, alimentando e catalisando esse clima em real... me atrevo a dizer que eles elevam a auto estima do mal de cada bandido - acredito em  muita coisa e questiono, a fim de lembrar que todos nós somos humanos. Minha maior pretensão é ponderar, apesar da raiva e do conflito que nos gera por julgar e condenar algo do qual desconhecemos, mas somos levados a pensar friamente pelo ângulo que nos apresentam como verdade. 

Meu intuito não é clamar por justiça, pois, ela se fará, de um jeito ou de outro e nem tudo que é legítimo é 100% certo, geometricamente perfeito e cartesiano, porque, na vida, nada é apenas preto no branco... as nuances existem  e, verdade, verdade mesmo, penso que nem as partes envolvidas sabem, afinal, cada um vê seu lado e isso é influenciado por tanta coisa que nem fazemos idéia que nos influencia.

Vamos lá, falar sobre o "in" ou "a"cidente que aconteceu em Salvador/Bahia, envolvendo um carrão, do tipo jipe urbano, daqueles que fazem com que nos sintamos acima de todos no trânsito e que é de uma simbologia muito forte em nosso imaginário, mas, também por ser visado como objeto de valor e leva a crer que quem o dirige é detentor de posses, cria uma outra simbologia, também muito forte, do medo de roubo, sequestro, etc. Por outro lado, uma moto, com duas pessoas, que, por ser moto, já se tem um estigma - quase um arquétipo, me corrijam os entendidos da nosso psicologia, afinal, sou leiga - de que todo motoqueiro/motociclista pilota de maneira arriscada e pondo em risco os outros no trânsito, com duas pessoas, o que nos remete ao medo de assalto - prática muito utilizada nos dias atuais. O trânsito em trânsito tem sido palco de imensas e diversas tragédias de diversos erros e errantes que se acham dignos de passarem por cima dos outros, afinal o egocentrismo ronda e envolve os motoristas, que, antes de tudo, são pessoas, gente, que por vezes são pedestres e esquecem disso... mal preparadas para a vida, imagina para um trânsito caótico, com tantos carros aumentando cada dia mais... Um parêntese, para ratificar, é como se faz a leitura dos sinais de trânsito... a semiótica nos lembra que para um signo fazer sentido, ele deve ser entendido, deve ter um significado ao qual ele remete. Pois bem, em nossa cultura popular e massificada da falta de educação - em todos os sentidos, inclusive o doméstico, moral e ético - isso não se completa... a ignorância com arrogância impera e a lei da selva e do "salve-se quem puder" se faz como representação da nossa postura, atitude e comportamento nas vias PÚBLICAS, onde agimos como se fossem NOSSAS e saiam da frente que eu quero passar. Respeito é algo que só existe no discurso ou no que diz respeito a mim, quando me faltam com ele... Quanta subjetividade burra! Resumindo esse parêntese que já se alongou demais, falo o que minha diarista falou, ao ver as ruas sinalizadas e as pistas demarcadas: "...isso só atrapalha! Nem todo mundo que dirige entende de lei de trânsito, não, isso é para você, que é estudada. Nem todo mundo sabe e confunde mais do que ajuda...". Por aí, temos uma ínfima amostragem de como pensa a nossa população que tira uma habilitação, compra um carro e sai nas ruas, para evitar os transportes públicos de péssima qualidade.

Voltando à tragédia soteropolitana, eu, também, ao ver a notícia, por acaso, num "noticiário" sensacionalista - argh! - fiquei indignada! Lógico! Como que uma discussão no trânsito pode levar a uma atrocidade dessas? O que foi divulgado: "Médica oftalmologista persegue moto e mata dois irmãos". Daí, passa a médica viva e a cena ultra chocante dos corpos do dois jovens largados na calçada, com sangue, em posições que nos remete à dor, mesmo. Daí, soltam pareceres de "testemunhas" que só viram o desfecho, onde o motociclista bateu no vidro do carro e disse alguma coisa e a motorista do carro os persegue, em alta velocidade, jogando o carro em cima deles que foram arremessados e colidiram com um poste. Diante das imagens na TV e de todo o julgamento prévio - e não estou dizendo que a médica seja inocente, também não penso que ela tenha saído de casa com a intenção de matar dois irmãos numa moto... - me vi condenando a médica e absolvendo os mortos... é como se a morte daquela maneira, inocentasse - caso eles fossem culpados. Se é que existe uma culpa e um culpado numa consequência de atitudes tensas e intensas.

Depois, como se tornou pauta de conversas, compreendia todas as formas de pensar. Mas, "ninguém estava lá!" - era isso que mais repetia em minha cabeça. "Ninguém sabe o que aconteceu... pessoas boas também erram e, pelo que vi, os dois lados - o lado do carrão e o lado da moto - eram de pessoas boas e do bem. 

O que me fica: explica mais não justifica!

Nada ali, ao meu ver, friamente falando e - como está na crista da onda, agora - hipervigilante, digo que NADA ali faz sentido. A gente tem visto crimes e crimes de trânsito por motivos aparentemente banais, se considerados isoladamente e fora do contexto original onde matar é algo "corriqueiro". Se ela - a médica - cometeu uma "barberagem"e jogou, no primeiro momento, o carro sobre a moto, ela estava errada e poderia, sim, ter causado um acidente. Tá, beleza! Daí, o motoqueiro, em vez de agradecer a Deus por estar vivo e demonstrar sim, sua raiva pelo susto da fechada, segue a criatura I - a médica -, bate no vidro do carro e fala sabe lá o quê. Ele está errado por se vingar? Depende dos nossos valores, né, para emitir julgamento DE VALOR. Eu, pensaria - aliás, eu PENSO e AJO assim, pois também dirijo e trafego nesse trânsito cão dos grandes centros urbanos do nosso país, com buracos na pista, falta de sinalização adequada, pouca iluminação em muitos lugares, etc - assim: "Vá-te a merda! Mas, deixa para lá! Graças a Deus estou viva e sem nenhuma baixa!". Isso me impede de sentir aquele ódio que sobe "pelas ventas" e o orgulho ferido por dirigir direitinho e me aparece uma pessoa dessas para jogar o carro em cima de mim? Pois é, bem que dizem que dois erros não fazem um acerto. Ela errou, primeiro, pela alegada falta de atenção no trânsito, fechando a moto, ele errou em persegui-la, ela errou em persegui-lo e ambos pagaram um preço muito alto nesse efeito cascata de tensão e terror. Ninguém pense que vai ser fácil para a médica. Muito menos para a família dela. Com relação à famílias dos jovens, nem se fala... Mas, assumirmos o papel de justiceiros não fará justiça. Justiça seja feita... o que imperou aí, ao meu ver, foram dias de fúria das duas partes. Reféns do medo, da tensão, da angustia que impera nos dias atuais. 

Por isso que afirmei, desde o início, não quero ser entendia, quero entender, quer questionar e refletir. Por quê? Porque isso envolve a todos nós. Somos vítimas de um mal coletivo, o assombro em excesso, que vem minando as nossas esperanças e que vem como consequência da apropriação indevida do sensacionalismos nos veículos de comunicação e de tudo que está ao nosso redor. 

Pois bem, o que levou cada um a agir como agiu? Tudo poderá explicar, volto a enfatizar, mas nada justifica. Os fins justificam os meios? Ambos foram autores, ambos assumiram o risco ao escolherem - e não me refiro na escolha como algo simples, considero nossas referências e tudo que nos cerca como fator de consideração ao se fazer determinada escolha, que pode ser um reflexo do medo ou uma fuga... enfim - determinadas atitudes de enfrentamento e de rivalidade. Ambos forma algozes e vítimas. 

Concordo que a justiça deverá agir, sim. Alegar hipervigilância para inocentá-la, ao meu ver, é muito pouco e muito vago... A mesma hipervigilância fez com que o motoqueiro tomasse susto e revidasse. Causa ou consequência? Se os jovens estivessem vivos, o leque se abriria mais e mais fatores seriam considerados. Quiçá fossem, até, condenados... Como vieram a óbito, a morte os inocentou... Volto a afirmar: para mim, ambos foram algozes e vítimas, não houve santo nem demônio, mas pessoas, humanos... emoção, reação.

Isso nos leva a refletir: em que mundo estamos? Em que mundo gostaríamos de estar? O que fazemos para colaborar com a construção desse mundo? Como agimos? Quais são os nossos valores? 

Pois é... o fato dessa história toda, incontestável, é que duas mortes aconteceram por conta de "banalidade", que não é tão banal assim, vista da ótica da complexidade do bombardeio que nos detonam a todo instante. Duas mortes, três vidas destroçadas diretamente e muitas outras indiretamente. 

No "salve-se quem puder" dos dias de hoje está a pergunta a resposta de para onde vai a nossa "civilização": CAOS. Está na hora da ordem se estabelecer. E, sério, cá entre nós, fazendo igual, com as mesmas atitudes, vamos mudar algo para melhor ou reforçar o pensamento de que "nada é tão ruim que não possa piorar"?

Façamos a nossa parte. Comecemos em nem julgar, nem condenar, mas questionar, observar, acolher, refletir, transformar o que somos, quem somos!

Meus sentimentos a todos os envolvidos diretamente na situação que, para nós, apenas um caso, para eles, a própria vida!

Pat Lins.

Quem tiver curiosidade, vale a pena assistir:


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